22 fevereiro, 2013

Saber esperar





Induzir o parto antes das 39 semanas pode ter riscos para o bebé.

A partir das 37 semanas de gravidez, espera-se que o bebé esteja pronto para nascer. Mas nem sempre é assim. Vários estudos indicam que, pelo menos, até às 39 semanas a barriga da mãe é o melhor sítio para se estar.
Marcar o dia do parto é, cada vez mais, uma prática habitual. Em Portugal e em muitos países ocidentais. Seja por cesariana ou por indução. Seja porque o médico sugere ou a pedido da mulher. Marca-se para garantir a presença do médico escolhido, marca-se para que o bebé nasça em determinado dia, marca-se para evitar que as águas rebentem numa hora que não dê jeito, marca-se porque se tem medo do inesperado. Marca-se o parto por muitas razões, poucas delas médicas, apesar de ainda nenhum estudo ter demonstrado que este procedimento é vantajoso para a mãe ou para o bebé.
Na gravidez, um dia a mais ou a menos pode fazer a diferença. A partir das 37 semanas, o bebé é considerado de termo, ou seja, estima-se que a maior parte dos bebés com esta idade gestacional esteja pronto para nascer. Mas nem sempre isso acontece. «A maturação enzimática do aparelho respiratório não acaba às 37 semanas. Não chega essa data e já está. É uma coisa progressiva. Por isso, à medida que o tempo passa, o bebé tem menos probabilidades de ter problemas respiratórios», explica Diogo Ayres de Campos, professor na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e obstetra no Hospital de São João, no Porto.
As recomendações internacionais, quer do Colégio Americano de Obstetrícia e Ginecologia, quer do Colégio Inglês de Ginecologia e Obstetrícia, são no sentido de esperar sempre, pelo menos, pelas 39 semanas de gravidez para provocar o parto.
Duas investigações recentes vieram reforçar o consenso. Em Fevereiro de 2009, um estudo publicado no American Journal of Obstetrics and Gynecology revelou que, nos bebés nascidos de parto induzido entre as 37 e as 38 semanas, 17,8 por cento precisaram de ficar internados, em média, 4,5 dias na unidade de cuidados intensivos neonatais. Nos bebés nascidos entre as 38 e as 39 semanas, o número de internamentos desceu para oito por cento. Depois das 39 semanas, apenas 4,6 por cento dos bebés precisaram de cuidados especiais. Nas conclusões, os autores deixam bem claro: «O parto electivo antes das 39 semanas está associado a um aumento da morbilidade neonatal e a um aumento do número de cesarianas, sendo, por isso, inapropriado».
O estudo envolveu 14 955 nascimentos após as 37 semanas de gestação, em 27 hospitais americanos, durante o ano de 2007. Destes, 4645 foram marcados sem razão médica, o equivalente a um terço dos partos. Em Portugal, não se conhece o número exacto de induções. Mas estima-se que seja bastante acima do valor recomendado pela Organização Mundial de Saúde: dez por cento.

CESARIANA AUMENTA OS RISCOS
Para o bebé, a eventual complicação mais grave resultante de um parto cedo demais é a síndrome de stresse respiratório. Um problema provocado pela imaturidade dos pulmões, que obriga o recém-nascido a ficar internado na unidade de cuidados intensivos neonatais para lhe ser administrado surfactante, substância que ajuda os alvéolos pulmonares a distenderem.
Outro estudo, que incidiu sobre 25 mil partos por cesariana electiva, demonstrou ainda que nascer antes das 39 semanas aumenta o risco não só de doenças respiratórias, como de infecções, hipoglicemia, internamento na unidade de cuidados intensivos e internamentos mais frequentes. A investigação do Instituto Nacional para a Saúde da Criança e Desenvolvimento Humano, nos Estados Unidos, concluiu que os bebés nascidos às 37 semanas por cesariana electiva têm o dobro do risco de sofrer de algum tipo de complicação em relação aos bebés que nascem às 39 semanas. Nascer às 38 semanas diminui o risco, mas, ainda assim, estes bebés têm mais 50 por cento de possibilidades de terem algum problema, pode ler-se no estudo publicado no New England Journal, em Janeiro deste ano.
Com a cesariana, os riscos para o recém-nascido ainda são maiores do que na indução (desde que a indução termine em parto vaginal) porque o processo de trabalho de parto e de expulsão do feto favorece a maturação dos pulmões do bebé.
 Diogo Ayres de Campos desdramatiza um pouco estes resultados: «Não são complicações que tenham sequelas ou desfechos negativos e são problemas muito raros. Mas não se deve esquecer que é, de facto, mais arriscado marcar um parto para antes das 39 semanas». Por isso mesmo, na maternidade do Hospital de São João, não se fazem induções ou cesarianas electivas antes das 39 semanas, a não ser que exista uma forte indicação médica. Mas não existe um consenso a nível nacional sobre esta matéria. «São os hospitais que decidem. Os hospitais centrais que conheço seguem as recomendações internacionais e não fazem induções antes das 39 semanas. Nos privados não sei como funciona», revela o obstetra, acrescentando: «Mesmo no caso de um bebé pélvico que vá nascer por cesariana programada, as recomendações são para esperar até depois das 39 semanas».

RAZÕES PARA UM PARTO MARCADO
A Organização Mundial de Saúde só fala em indução do parto depois das 42 semanas de gravidez. Antes desse tempo, a organização recomenda uma vigilância pré-natal mais apertada. O Instituto Nacional para a Saúde e Excelência Clínica, entidade britânica de grande importância científica, desaconselha a indução de parto a pedido da mulher por ser «uma intervenção desnecessária e ter riscos». A única excepção para antecipar o parto sem uma razão médica, segundo o instituto, são os casos em que o pai do bebé tem de ausentar-se para locais de guerra. Ainda assim, a indução só deverá «ser considerada às 40 semanas ou depois».
Mesmo em casos de suspeita de bebé muito grande ou de incompatibilidade feto-pélvica – motivos invocados habi-tualmente por médicos para marcar uma indução –, os especialistas britânicos aconselham a esperar pelo início do trabalho de parto espontâneo. Dizem que não há uma forma de medir com exactidão estes parâmetros.
A indicação mais consensual para uma indução está relacionada com o facto de a mãe ser portadora de uma doença que se agrava à medida que a gravidez vai evoluindo, como hipertensão, diabetes ou doença cardíaca. Em relação às cesarianas electivas, é consensual que se realizem em situações de doença infecciosa da mãe e no caso de placenta prévia. Mais controversa é a indicação para fazer cesariana por o bebé estar sentado (bebé pélvico) ou em posição transversal. Existe uma manobra, que pode ser realizada durante a gravidez (versão externa), para ajudar o bebé a colocar-se na posição correcta.
Esperar pelo início espontâneo do trabalho de parto é a melhor opção para as gravidezes de baixo risco. Todos os estudos científicos assim o demonstram. As últimas semanas dentro da barriga da mãe são igualmente importantes para o bebé. Os argumentos de que a partir de determinada altura «o bebé não está lá a fazer nada» ou que «só está a engordar» são enganadores. O bebé precisa de tempo para tomar a decisão de nascer.

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